Bares e restaurantes aderem ao movimento mundial contra os canudos de plástico.
Quatro minutos na boca, mais de cem anos nos oceanos. Essa é a média do tempo que usamos um canudo de plástico e que o material leva para se decompor no mar, para onde vão cerca de oito milhões de toneladas de plástico por ano, segundo o grupo Ocean Conservancy. Isso sem falar que, por aqui, ele ainda vem em uma embalagem de… plástico. E se você só se deu conta disso depois que o vídeo que mostra o utensílio sendo tirado da narina de uma tartaruga viralizou (já são quase 20 milhões de visualizações), saiba que bares e restaurantes, antenados com um movimento mundial, já estão em busca de alternativas para mudar esta história.
– A questão do lixo sempre me incomodou. A gente fala muito de onde vêm os produtos, mas não para onde o lixo vai, e isso interfere em tudo – acredita Nathalie Passos, do Naturalie Bistrô, que acaba de substituir os canudos de plástico pelos de inox e recebeu elogios e críticas pela mudança. – Teve gente dizendo que é anti-higiênico. Mas o canudo deve ser tratado como qualquer outro utensílio que vai à boca, como talheres e copos. Tem uma escovinha específica para a higienização.
Sucesso na casa, os sucos – como o Colágeno (manga, morango, água de coco e tâmara) – decantam, e o canudo funciona, principalmente, como um mexedor.
Desde que abriu, em 2016, o bar de vegetais Teva (que significa natureza em hebraico) nunca teve canudos de plástico, apenas de inox ou papel. Faz parte do conceito do lugar. A limonada de lavanda orgânica com limão-siciliano e o suco de jambo (com cranberry e água de coco), por exemplo, são servidos com canudos de papel. Alguns coquetéis como o Yasmim (gim, infusão de hibisco, limão e hortelã) vem com o canudo de inox.
– A maioria dos nossos clientes tem consciência alimentar e de um mundo mais sustentável, e os canudos entram aí – diz o chef Daniel Biron, dizendo que a iniciativa tem um, porém. – As pessoas gostam tanto que acabam “levando” os canudos de inox para casa, principalmente o de caipirinha (com cachaça orgânica). Já pensei até em botar um GPS nos canudos – brinca.
É um investimento, são muito caros. Funcionam em drinques específicos, mas para um restaurante inteiro, a conta não fecha – pondera Eduardo Bellizzi, do Quadrucci, que tem alguns poucos canudos de plástico em estoque para clientes intransigentes. – Até que a gente tenha uma opção viável de fibra biodegradável, a saída é reduzir o uso e educar o público. Mesmo assim, não vamos comprar mais.
Em um ano, os 50 canudos de metal usados no Garoa Bar Loung, no Leblon, evaporaram. Mas uma nova leva chega no fim do mês para o lançamento da carta de releitura de clássicos. O utensílio virá da matriz em Santiago de Compostela, na Espanha, para ser usado no La Danada Soy Yo!, uma releitura do Paloma (tequila, saquê, limão, hortelã e soda grapefruit,).
– Depois da campanha #VoltaCaneca, pedindo o retorno das canecas do Moscow Mule (levadas por clientes), vou lançar a campanha #VoltaCanudo. Ou melhor, #FicaCanudo” – ironiza a gerente Carolina Arruda, que vai intensificar o controle das devoluções dos utensílios.
Lá fora, as ações para abolir o vilão dos mares são cada vez mais intensas. Uma das primeiras campanhas foi a “Be straw free” (“Livre-se do canudo”), iniciada em 2011 pelo americano Milo Cress, com apenas 9 anos na época. Por aqui, um dos pioneiros a aderir ao movimento foi o Zazá Bistrô, que rompeu de vez com o plástico em 2014.
Sem os canudos, as bebidas passaram a ser servidas em copos mais largos ou com as taças crustadas (ou seja, com com algum ingrediente incrementando a borda), “um truque” para ninguém sentir falta do canudo, e com mais sabor. Uma das opções que faz mais sucesso é a de chocolate apimentado, no drinque Shangri-lá (vodca, morango, cranberry, hortelã e limão).
Outra alternativa são os canudos de vidro. Antes que alguém tenha medo de o utensílio ser frágil, é importante saber que eles são feitos de boros silicato, material resistente a quedas e a altas temperaturas. O Rio, inclusive, já tem uma fábrica, a Mentah!, de alimentos e produtos sustentáveis, fundada há oito meses. Seu primeiro cliente foi o Beefit, em Ipanema.
– Casa com nossa proposta de consumo consciente – conta Emerson Goncos, dono da lanchonete, com 18 lugares.
Na linha do sem glúten, sem lactose, sem conservante, o Beefit usa canudos para servir suco, kombuchá e smoothies. Eles são lavados com água, detergente e uma escovinha própria e ficam dentro de uma capa individual antes de ir ao copo. Se o cliente quiser, pode levar um kit casa: canudo, escova e capa.
Em busca de um material ecológico o plástico, a chef Tati Lundi apostou no bambu, mas não deu certo: eram difíceis de limpar, quebravam com facilidade. Hoje, quem pede sucos (como o de frutas vermelhas com tâmaras, macá peruana, manjericão e pimenta) ou smoothies pode usar um de vidro.
Um dos maiores incentivadores da causa por aqui é Marco De la Roche, editor do Mixology News, maior portal nacional de coquetelaria.
– Além do acúmulo de lixo nos oceanos, o canudo promove uma experiência sensorial infantilizada do coquetel, que começa pelo cheiro – explica Marco, defendendo a suspensão do uso de canudos principalmente em gim tônicas, Aperol spritz, e caipirinha.
Pouco usada, mas não menos eficiente, é a opção do macarrão, iniciativa que chegou por aqui pelas mãos de Fábio la Pietra, do SubAstor.
– O canudo de macarrão entrou para o nosso bar há quatro anos em São Paulo e há dois no Rio, desde quando o Sub abriu – diz Fabio, garantindo que não atrapalha no sabor. – Mas o ideal mesmo é servir sem canudo.
É o que fazem no Empório Jardim. Mas, se o cliente insistir, ganha um de papel.
– Deixamos de levar o canudo, explicamos a mudança pelos do tipo biodegradáveis de papel, e perguntamos ao cliente se ele quer, ainda assim. A grande maioria tem dito que não – conta a sócia Branca Lee. – As pessoas usam canudo no automático. É preciso uma mudança de hábito.
Por lei, restaurantes, lanchonetes, bares e até ambulantes são obrigados a usar apenas canudos de plástico embalados individualmente. A multa pode chegar a R$ 3 mil. De acordo com a coordenadora do setor de alimentos da Vigilância Sanitária, Aline Borges, a questão dos canudos reutilizáveis ainda não entrou na pauta.
– É uma demanda que está surgindo dos próprios estabelecimentos, por causa do meio ambiente. Mas a lei foi criada pensando na saúde pública – explica Aline, ressaltando que as casas fora do padrão podem ser multadas, inclusive as que usam os de metal ou vidro.